Tuesday, May 15, 2012

Santo Antônio em Terra de São Valentim

Escultura Love, de Robert Indiana. Foto: Nina Raquel
Daqui há aproximadamente um mês será dia dos namorados em Brasília: presentes apressados sendo comprados pelo Plano Piloto, casais que aguardam sorridentes suas reservas em restaurantes lotados e amores com vistas para o Lago. Em Nova York, será uma terça-feira como qualquer outra. E eu já deveria ter me acostumado com a tradição local do 14 de Fevereiro, mas confesso que simpatizo mais com o nosso "Santo Casamenteiro" do que o mundialmente famoso São Valentim. Além disso, acho que a importância das coisas está na carga de emoção, memórias e sensações que elas trazem consigo e, nesse caso, o 12 de Junho, por repetição e definição, me lembram de casa, onde ainda está meu coração. Nova York não escancara no romantismo como outras cidades, mas existe algo que parece dizer “não é de amor que você vai viver aqui, mas vamos te relembrar que é importante encontrá-lo no caminho. Seja em algo, em alguém ou em você". A cidade faz questão de nos lembrar que existe amor e delicadeza disfarçados em suas ruas lotadas, em interações descuidadas, em olhares que se cruzam por segundos, é só prestar atenção, já que ela não nunca desacelera para que a busca seja mais fácil. Os lembretes, no entanto, funcionam. Na esquina da Sexta Avenida com a Rua 55, encontra-se uma escultura de quase quatro metros com as letras LOVE, do artista Robert Indiana. A imagem foi criada originalmente para o cartão de natal do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) em 1964, e virou escultura em 1970, no Museu de Artes de Indianápolis. Ela é reproduzida em vários outros estados, países e idiomas. E apesar da original estar em Indianápolis, a versão de Nova York é mais colorida, mais bonita e melhor localizada.

Ponte do Brooklyn. Foto: Nina Raquel
Um segredo de Nova-Iorquinos e turistas apaixonados é o de colocar as iniciais do casal em um cadeado e trancá-lo em uma das grades da histórica Ponte do Brooklyn. Cada vez mais pode-se ver cadeados gravados com letras, nomes e corações por seus bancos, grades e muros. Apesar de bonitinhos, os cadeados são contra as regras da Ponte, que possui placas alertando os pedestres de que nenhum tipo de "acessório" pode ser colocado em sua estrutura. Não se sabe se a vigilância local faz vista grossa, mas que existem cadeados de 2007 que ainda estão lá, existem. O Departamento de Transportes da cidade já informou que não se incomoda com as declarações de amor, mas elas têm que ser feitas em lugares pouco visíveis e de pouca movimentação, e se os cadeados começarem a se multiplicar a ponto de afetar o visual da Ponte, irá começar a recolhê-los. Nesse sentido, vale usar o conselho do poeta Quintana, "Se tu me amas, ama-me baixinho. Não o grites de cima dos telhados. Deixa em paz os passarinhos". Para os que decidirem se aventurar, melhor achar uma grade discreta e selar seu amor por lá.

Uma tradição curiosa da cidade é a de postar declarações de amor das mais exageradas para desconhecidos na sessão "missed connections", ou "conexões perdidas", da página "craigslist" de Nova York, uma plataforma onde se vende, se compra e se troca literalmente tudo. Lá, Nova-Iorquinos postam detalhes sobre pessoas que viram no trânsito da cidade (metrôs ou ônibus) e por quem se apaixonaram à primeira vista, na tentativa de tentar reencontrá-las. Esquisito? Um pouco. A parte legal é que as conexões perdidas são categorizadas em "de homem para mulher" e vice-versa, "de homem para homem" e "de mulher para mulher". Todo dia 14 de Fevereiro, o Museu do Trânsito de Nova York realiza a "Festa das Conexões Perdidas", em uma plataforma de metrô antiga e desativada da coleção do Museu. Jornalistas e escritores conhecidos do New York Times fazem leituras, poesia e graça dos anúncios mais interessantes e artistas expõem pinturas inspiradas nas conexões perdidas. O evento é totalmente gratuito e se não der para se emocionar com as declarações, dá para se divertir. A festa é anunciada na página do museu: http://mta.info/mta/museum/

Capa do álbum The Freewheelin', de 1963. Foto: Don Hunstein
Nova York foi o cenário de uma das minhas fotos preferidas, a de um amor despretensioso, de um encontro que não foi eterno, mas foi intenso, e está imortalizado na capa de um dos melhores álbuns da história. O jovem Bob Dylan, de vinte e dois anos, e sua então namorada Suze Rotolo, caminham sorrindo e de braços dados para a capa do seu segundo álbum, The Freewheelin', que tem entre seus clássicos "Blowin' in the Wind" e lançou o artista como ícone mundial da música folk. O ano é 1963 e o bairro é Greenwich Village, na Rua Jones com a Rua West 4. A foto foi tirada a poucos metros do prédio número 161 da Rua West 4, onde Dylan morava. Histórias de amor como essa, que começam inadvertidas e sossegadamente improvisadas, podem tornar-se clássicos ou, no mínimo, muito especiais para quem as viveu nessa cidade.

Capa da revista Americana Life, de 1945. Foto: Alfred Eisenstaedt
Em 1945, Nova York também foi o cenário do beijo mais apaixonado e improvisado da história, entre um marinheiro e uma enfermeira que nunca haviam se visto antes, em comemoração ao fim da Segunda Guerra Mundial. A cada cinco anos, a administração da Times square organiza um evento "do beijo" onde centenas de casais, vários vestidos de marinheiros e enfermeiras, vão para a mesma localidade do famoso ato, na Sétima Avenida próximo as ruas 44 e 45, e recriam a cena outra vez. Havia pouco a se celebrar nessa época, tempos tristes de guerra e injustiças. Mas um beijo como esse aconteceu e isso, em si, merece ser relembrado.
O próximo evento será no dia 14 de Agosto de 2015. Para mais informações:
http://www.timessquarenyc.org/events/kiss-in 

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